Por uma Psicologia da Cognição e do Afeto, a Favor da Infância e da Subjetividade *

 
Patricia Holanda MEDIUMProfessora Doutora Patrícia Helena Carvalho Holanda **

 

 

 

 
Juraci Cavalcante SMALLProfessora Doutora Maria Juraci Maia Cavalcante ***
 

 

 

 

 

 

 

“Ao completar o seu centenário, sua obra é alvo de estudos e comemorações em Portugal, sabendo-se que a sua teoria retrata o pensamento de um grande humanista, que teve formação em Medicina e especialização em Psiquiatria e Psicanálise. Estas aproximações lhe permitiram realizar pesquisas sobre a criança, numa perspectiva inovadora, que foi muito além do enfoque então dominante da Patologia. Ao assumir tal posição, João dos Santos nos coloca diante de uma visão integrada de desenvolvimento da criança, que envolve a educação na família, na escola e na comunidade.

A sua obra traz uma reflexão sobre a teoria psicanalítica, articulada com sua prática profissional, desmistificando que o lugar da Psicanálise se restrinja apenas ao consultório dos analistas e a coloca na escola, inclusive na sala de aula, a serviço da educação e de uma maior compreensão do desenvolvimento infantil. Concebeu ensinamentos originais sobre a necessidade de articulação dessa ação educativa, que envolve a formação de pais e professores.”

[…]

“Buscaremos enfocar, sobretudo, o modo como esse notável psicanalista estuda a subjetivação da criança, que está diretamente vinculada à forma como o sujeito vê a si mesmo e o mundo em que vive. Sem esquecer do legado que a teoria de João dos Santos deixou para a Psicopedagogia, ao chamar atenção dos profissionais de saúde e educação para a importância da subjetividade, pois advoga que ela é constituída de tudo aquilo a que a criança outorga sentido e que esse sentido tem um significado singular e particular, que está relacionado às condições iniciais de construção mental dos sujeitos.

Trata-se de um princípio basilar de sua teoria, que, em última instância, vai explicitar que é impossível duas pessoas sentirem a mesma coisa em relação a uma dada vivência. Em outras palavras, a teoria de João dos Santos recomenda que a criança seja vista enquanto ser em desenvolvimento, o que o levou a criar uma teoria capaz de dar conta de forma integrada de todos os seus aspectos.”

[…]

“Pelos meandros da constituição da subjetividade infantil e educação

Um dos aspectos inovadores da teoria santiana consiste na preocupação em resolver uma das questões – que, por sinal, mais vem ocupando a Psicologia, nos últimos tempos – que é a articulação entre a razão e a afetividade, ao se preocupar com a construção de uma teoria do desenvolvimento infantil que favorecesse, tanto o desenvolvimento cognitivo, quanto afetivo. Para tanto, tematiza uma série de questões no âmbito estrutural e conjuntural, a começar pela crise da família, da escola. Sem esquecer, dos principais atores envolvidos: os alunos, professores e pais.

Nesse sentido, ao construir a sua teoria, procurou superar a cisão entre conhecimento e emoção. Uma vez que a sua perspectiva teórica não se ateve apenas ao sujeito epistémico, como se observa na Psicologia e suas teorias de aprendizagem, cognição, percepção etc. Estas são abordagens, sabidamente, dissociadas de outras teorias que concentram seu interesse na constituição do sujeito, sobretudo, as psicanalíticas. Este aspecto da teoria de Santos é aludido com destaque por Carvalho e Branco (2010, p. 160), ao sublinhar o cuidado dele em salientar as diferenças marcantes que imprime à sua abordagem, quando aproxima a Psicanálise da Educação e da Pedagogia.

A psicanálise que é a análise da transferência, é diferente da psicoterapia reeducativa. Os psicólogos estudam essencialmente comportamentos; a psicanálise estuda o funcionamento psíquico em termos de vida interior, naquilo que constitui a experiência única (não os comportamentos gerais), segredo, secreto, o inconfessável, isto é, as imagos e o objeto interior. Wallon e Piaget explicam o enquadramento instrumental inteligente do homem; Freud explica o objeto interior. Os psicanalistas modernos desenvolveram os conceitos de relação de objeto, a partir da expressão que Freud utilizou em Luto e Melancolia. Mas nem Wallon nem Piaget se refeririam ao objecto interno, o maior equívoco nas discussões entre psicólogos e psicanalistas. Pode-se deduzir da experiência analítica as suas consequências pedagógicas e fazer um pouco de psicologia genética de inspiração analítica que correntemente se designa por psicanálise genética. Mas só se deve considerar psicanálise apenas a que Freud praticou essencialmente a partir de doentes adultos.

No pensamento de Santos, pode-se perceber ainda a influência que recebeu da renovação da Pedagogia, no período do pós-Segunda Guerra mundial, ao romper com o pensamento instaurado anteriormente, que preconizava dever aquela considerar apenas o sujeito cognitivo, ao se concentrar apenas na sua capacidade para conhecer, em detrimento de uma visão do sujeito integral. Desse modo, a defesa de suas ideias chama atenção dos educadores, psicólogos e psiquiatras para a necessidade de ser considerada a individualidade do sujeito, sob pena, de este não se abrir para a aprendizagem do conhecimento transmitido.

Sara Pain (2009) em seu livro, Subjetividade e Objetividade: relação entre desejo e conhecimento, parece concordar com Santos, ao defender que a Pedagogia está situada num ponto de cruzamento entre duas formas de construção de pensamento. Para a autora, a objetividade se encontra relacionada às relações lógicas, como, por exemplo, classificação e seriação, os conteúdos didáticos, as leis externas. No que concerne à subjetividade, sua atuação vai ocorrer no campo do desejo, a afetividade e a simbolização, que são diretamente responsáveis pelos significados que o sujeito atribui às suas vivências, bem como suas expressões.”

 

            Excertos do artigo “João dos Santos: Por uma Psicologia da Cognição e do Afeto, a Favor da Infância e da Subjetividade” publicado no livro “Historia da Educação Comparada: Missões, Expedições, Instituições e Intercâmbios” publicado pela Editora da Universidade Federal do Ceará. www.editora.ufc.br | email: editora@ufc.br

**          Professora Doutora Patrícia Helena Carvalho Holanda
Mestre e Doutora em Educação Brasileira. Professora Associada do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação, da UFC (Universidade Federal do Ceará), Pesquisadora da Linha de História da Educação Comparada, Pós-Doutorado em Desenvolvimento Profissional Docente (UNB). Pós-Doutora em História da Educação junto à Faculdade de Motricidade Humana, Universidade de Lisboa. 

***        Professora Doutora Maria Juraci Maia Cavalcante
Professora Titular da UFC (Universidade Federal do Ceará). Doutora em Ciências Sociais e Econômicas pela Universidade de Oldenburgo -Alemanha, com Pós-Doutorado em História das Políticas Educacionais (Universidade de Colônia-Alemanha) e em História da Educação (Universidade de Lisboa). Coordenadora da Linha de História da Educação Comparada/Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira-UFC. Pesquisadora do CNPQ


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    Cecília Menano, João dos Santos e Maria Emília Brederode Santos em conversa

    Clique na seguinte ligação para para visualizar este vídeo do Instituto de Tecnologia Educativa – RTP (1975) A Escolinha de Arte de Cecília Menano – com Cecília Menano, João dos Santos e Maria Emília Brederode Santos, que foi muito generosamente disponibilizado pelo Dr Daniel Sasportes (19 minutos). [Clique nesta ligação]

     


  • Programa IFCE no Ar, Radio Universitária

    Entrevista sobre o andamento do curso à distância “Introdução ao Pensamento de João dos Santos”

    Entrevista gravada com a coordenadora do curso “Introdução ao Pensamento de João dos Santos”, Professora Patrícia Holanda da Linha de História da Educação Comparada da UFC (Universidade Federal do Ceará), com o Doutor Luís Grijó dos Santos (filho de João dos Santos), e a coordenadora pedagógica do curso Professora Ana Cláudia Uchôa Araújo da Directoria da Educação à Distancia do IFCE (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará). A entrevista foi realizada pelo jornalista Hugo Bispo do Programa IFCE no Ar em 3 de Novembro de 2016.

    Para ouvir a gravação desta entrevista clique nesta ligação.

     


     

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